segunda-feira, 4 de julho de 2011

Guimarães em Tempo de Guerra VII


Com o fim da Guerra Civil, chegaram a Guimarães muitos dos constitucionais que tinha estado presos em diversos pontos do país e do globo. Vinham dos mortíferos presídios de África, dos exílios mais ou menos dourados na Europa e, na sua grande maioria, das diversas cadeias miguelistas em Portugal. Estes prisioneiros, militares e políticos, chegavam a Guimarães após longos anos de sofrimentos e perdas irreparáveis. A título de exemplo podemos referir os casos do Capitão de Milícias Inácio Moniz Coelho da Silva e do Tenente de Milícias José Manuel da Costa. O primeiro, grande proprietário, descendente de uma ilustre Casa de Celorico de Basto (Casa da Veiga), viu-se pronunciado na “Devassa de 1828”, foi capturado, privado de todas as suas honras e privilégios e condenado a ser levado pelas ruas do Porto com um pregão, em direcção à forca onde deveria morrer (a cabeça, após o enforcamento, deveria ser cortada e exposta no Toural, numa estaca, durante três dias). A sua pena foi comutada em degredo para Inhambane (Moçambique) onde esteve de 1828 até 1837, altura em que conseguiu regressar a Guimarães. O segundo, botequineiro no Toural, foi capturado em 1828, tendo estado preso em Braga e Guimarães. Em Guimarães, na cadeia, soube da notícia da morte da sua mulher e do seu pai (deixando os seus filhos a cargo de um amigo), pouco tempo antes de ser transferido para a prisão da Covilhã onde ficou até 1834.

Quando estes e muitos outros homens chegaram a Guimarães os seus sentimentos eram dúbios. Se por um lado tinham vontade de regressar para suas casas e para junto de suas famílias, por outro lado havia neles um desejo de vingança para com aqueles que os tinham denunciado ou capturado. Nos anos que se seguiram à Guerra Civil, deram-se diversos casos de violências contra os miguelistas que permaneceram em Guimarães. Algumas das vinganças mais violentas, chocaram Guimarães, tendo sido anotadas pelo Cónego Pereira Lopes Lima (já referido nestas crónicas). Vejamos alguns casos:

19/04/1834 -“Foram alguns indivíduos a casa do Mendes, mercador, morador atrás do Tanque e lhe deram muitas espadadas e facadas, cortando-lhe até o nariz. Foi por ele ser testemunha contra alguns constitucionais na Devassa de 1828”.

20/06/1834 – “De noite indo o padre José Dionísio e o Coelho Bombeiro, sargento de caçadores 12, a casa de José Pasteleiro, à Rua de Donães, e tendo o supradito padre tirado satisfação com o José Pasteleiro por ele ter jurado contra ele por constitucional, e até tendo-o ferido com uma espada, o José Pasteleiro pegou em uma clavina que tinha atrás da porta e deu um tiro, do qual matou o tal Coelho, fugindo o pasteleiro ferido e muito mal tratado. Depois deste fatal acontecimento acudiu muito povo e voluntários do batalhão móvel e entraram na casa do Pasteleiro e lhe roubaram quase tudo, deitando fogo à casa que, por logo acudirem, não progrediu. (….)O defunto sargento, homem que tinha feito grandes serviços à causa constitucional, tendo entrada em quase todas as acções, estava à espera de sair oficial. Foi sepultado na tarde do dia seguinte no Campo Santo.”

21/06/1834 -“Deram umas poucas de facadas em um homem, na Rua de S. Domingos, por ter jurado contra constitucionais. Foi para o hospital quasi morto. Chamava-se "O Seco", e morava em S. Lázaro”

Para além destas vinganças levadas a cabo pelos constitucionais, Guimarães vivia momentos de autentico caos.O assassinato de um membro do Batalhão Móvel de Guimarães (corpo formado por constitucionais) parece demonstrar que apesar do clima de terror imposto pelos constitucionais, havia quem lhes fizesse frente e, acima de tudo, revela o clima de desordem que se vivia. O caso, de contornos bastante estranhos, deu-se da seguinte forma: “Na portaria das freiras Capuchas apareceu morto um voluntário do batalhão móvel desta vila, com os testículos negros e esmagados, pelo que se presumiu que lhos esmagaram”.

Não eram só as vinganças que marcavam a actualidade de então. Os constitucionais queriam receber indemnizações pelos danos sofridos durante o período de domínio miguelista. E queriam, também, aceder aos cargos e empregos até então ocupados pelos partidários de D. Miguel.

Pouco tempo depois de vencerem a guerra, os constitucionais começavam a batalhar entre si, pela justiça, pelos empregos e pela política.


(na imagem José Manuel da Costa, Tenente de Milícias e dono do Botequim do Vago-Mestre no Toural)

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